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Essa terça li sobre um exercício de escrita que é, na verdade, uma armadilha de memória: criar uma lista de listas. Isso mesmo. Uma lista de categorias que poderiam virar listas, mas que não precisam ser preenchidas. São só títulos, possibilidades, janelas abertas. A brincadeira é deixar que esses títulos contem uma história por si.
Fiz a minha própria lista. Antes de mostrar, preciso dizer que achei o exercício interessante e revigorante, estava travada na escrita e senti que ele me ajudou a destravar, tanto que acabou se tornando tema dessa newslleter.
Aqui vai um pedaço da minha:
Momentos em que fui minha melhor companhia
Pessoas para quem eu disse “eu te amo” e realmente quis dizer.
Estranhos que vi no metrô e ainda lembro.
Narizes que encostei com o meu.
Situações em que alguém achou que eu não percebi que estava sendo insultada, mas eu percebi.
Estações do ano em que fiz recomeços inesperados
Receitas que tentei porque vi no Pinterest no metro a caminho do trabalho
Coisas que comecei só para me curar de alguma dor (pilates por exemplo)
Professores que me marcaram sem nunca saberem
Pessoas com quem fui eu mesma, de verdade, nem que tenha sido por 15 minutos mágicos
Objetos que quase comprei, quase levei, e ainda penso neles
Aulas que fiz só por impulso e ficaram para sempre (curso de cerâmica)
Essas pequenas listas também revelam outra coisa: o quanto a gente, principalmente mulheres, não fomos incentivadas a termos hobbies. A gostar do tempo que passamos conosco. A fazer coisas que não têm propósito, nem retorno, nem meta. Só pelo prazer de fazer.
E isso me lembra de uma ideia que me marcou muito: luz emprestada. Já ouviu falar? É quando a gente brilha ao lado de alguém que parece iluminar tudo. Um ator famoso, um amigo querido, uma pessoa magnética. Eu já estive nessa luz, em elevadores, mesas de jantar, bastidores. Às vezes só por segundos. Às vezes por meses.
Antes, já afirmei que gosto da luz emprestada sem restrições. Mas será que isso é mesmo verdade? No começo, estar perto dessa luz é excitante. Você está perto da beleza, da inteligência e esse novelo de brilho te permite pelo menos continuar existindo no elevador. Mas, com o tempo, um som distante começa a tocar. Primeiro parece uma flautinha numa sala longínqua.
Depois vira uma banda de metais, e o som ecoa dentro de você. Aquele ressentimento inevitável. E, lá, no fundo, você se pergunta: “Mas o que tem de tão especial nessa pessoa mesmo?” Será o seu carisma? Será que ela usa um xampu diferente?
A verdade é que, por temperamento, eu sempre vou me sentir no começo da vida e isso significa, muitas vezes, procurar a luz do outros enquanto ainda aprendo a acender a minha. Hoje, por exemplo, comprei uma espada de são jorge na promoção e coloquei num banco na frente da janela onde trabalho. Ela e eu parecemos sugerir uma narrativa que não tem ponto de partida.
Na semana passada vendi um espelho, e me vi refletida no vidro sendo carregado embora. Mais tarde, vou procurar algo para assistir. E não vou me importar se o enredo fizer sentido.
Acho bonito isso: a possibilidade de existir sem um enredo pronto. De se reinventar no susto. De cultivar pequenas vaidades. De rir de trocadilhos ruins. De gostar de quem a gente é quando ninguém está olhando.
E você, qual seria sua lista de listas?
Curadoria Semanal
Como uma fã incondicional do Niemeyer e de seu trabalho, conheci esse ano um de seus projetos, uma casa suuuuper verde, um verdadeiro sonho arquitetônico, você já conhecia esse projeto de casa dele? Fiquei completamente fascinada!
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